Grupo Bittencourt
Grupo Bittencourt

O franchising cresce, amadurece e aparece

Depois do comércio eletrônico, o setor de franquias no Brasil é aquele que maior e mais consistente crescimento tem tido nos últimos anos.
Em 2009 deverá ter expansão de 14,5% no seu faturamento e já projeta pelo menos 15% para 2010. São 1460 redes de franquias em 2009, contra 1379 em 2008, com um total de 80 mil franqueados. Um setor que cresceu, amadureceu nas suas práticas e processos, nos modelos de negócios e aparece de forma cada vez mais consistente no cenário econômico.
Essa história poderia ser dividida em algumas ondas que se sobrepuseram ao longo do tempo e permitiram que o setor de franquias brasileiro chegasse ao estágio de se tornar “benchmarking” no mundo, como puderam constatar os representantes de associações nacionais de diversos países que acompanharam o encontro da ABF – Associação Brasileira de Franchising na semana passada na Bahia.
A primeira onda na evolução do setor, a do Descobrimento, ocorreu na década de 70, e foi caracterizada pela importação dos conceitos básicos, pelas mãos de consultores, advogados e precursores ligados a algumas redes de varejo e serviços, que iniciaram o trabalho de disseminar a alternativa como modelo de organização e opção de canal de distribuição, em especial para a indústria da moda.
Redes internacionais que estavam no Brasil e o estudo e pesquisa sobre as operações no mercado externo foram inspiração básica desse período.
Na segunda onda, a do Desenvolvimento, a motivação para o aperfeiçoamento veio das redes do setor de hospitalidade e alimentação que tinham práticas mais desenvolvidas, o acompanhamento do que ocorria no mercado internacional, os erros e os acertos dos que estavam no mercado e o próprio processo de desenvolvimento, aculturação e ajustes das práticas existentes no país. Foi um período marcado pelo intenso aprendizado, porém, com a disseminação do conceito, nem sempre com o rigor que o sistema demandava. E por conta disso inchou, mais do que cresceu, trazendo alguns negócios que se aproveitaram do interesse que a proposta e o conceito geravam para envolver e vender mais do que podiam entregar.
Foi um período caracterizado pelo uso intenso da franquia como canal de distribuição de produtos como um fim em si mesmo, distanciando-se da incorporação de conceitos maduros de gestão do negocio de franquias, à despeito da atuação da ABF em defesa dos princípios e das melhores práticas.
A lei brasileira sobre franquias, de no. 8955 de 15.12.1994 foi um marco importante que contribuiu decisivamente para caracterizar a transição para a terceira onda.
Essa foi a da Depuração, com o mercado e o próprio sistema revendo a forma de atuação de alguns franqueadores sob pressão da entidade do setor, das publicações, das pesquisas comparativas e franqueados insurgindo-se sobre o que lhes era oferecido em relação às propostas feitas no momento da sua incorporação ao negocio. Inegavelmente o aumento da participação de redes internacionais no Brasil, usualmente com modelos mais maduros e consolidados, em especial no final da década de 90, contribuiu para gerar benchmarks que ajudaram nesse processo depurativo, criando as bases da quarta onda, a da Consolidação.
A partir do novo século o setor de Franquias no Brasil começou a viver um momento, caracterizado pelo amadurecimento de todos os agentes envolvidos no processo. Franqueadores, consultores, prestadores de serviços, a mídia envolvida, os próprios dirigentes das entidades e também os franqueados que, mais informados e preparados no processo de negociação também contribuíram para que mais fosse oferecido e de forma mais consistente e madura.
Desde meados desta década o setor tem vivido uma nova onda, a da Excelência, caracterizada por dois vetores distintos, porém convergentes em sua contribuição para a evolução da atividade.
Um dos vetores foca o processo de aperfeiçoamento contínuo das práticas com a incorporação de instrumentos de governança e gestão que contribuem para a melhoria do desempenho do negócio, do avanço e amadurecimento das relações entre franqueados e franqueadores, com programas mais avançados de treinamento e desenvolvimento de equipes e do uso mais intenso de ferramentas mais sofisticadas de pesquisa, mensuração de mercado e desempenho da rede como um todo e também por área geográfica, perfil de publico e dos franqueados.
De outro lado, como um elemento relevante desse processo de Excelência, algumas redes brasileiras se dão conta de sua condição de atuação internacional, levando marcas, produtos e serviços brasileiros para o mercado internacional, de uma forma que o próprio varejo e serviços como hospitalidade não ousaram fazer, com algumas poucas exceções. Mas no setor de franquias já são 66 marcas brasileiras que levantaram o alvo e estão encarando o mercado global, aprendendo em pleno vôo e ajustando a forma e os métodos e abrindo caminho para que outros mais possam ter a mesma iniciativa. Também nesse aspecto a atuação da ABF, com o apoio da Apex, tem sido primordial para esse projeto.
Nessa quinta onda, a da Excelência, e nas próximas que se sucederão alguns elementos terão papel fundamental no desenho estratégico do futuro do setor.
A redução da informalidade é talvez um dos mais importantes. Nas primeiras ondas muitas das operações só se sustentavam pela adoção de práticas “heterodoxas” por franqueados para serem realmente estimulados a continuar investindo na abertura de novas unidades. No processo de depuração essas alternativas começaram a ficar mais escassas. Na realidade atual e no futuro próximo essa opção tenderá a reduzir-se dramaticamente, se não desaparecer, por conta das ferramentas hoje disponíveis pelo governo, através de cruzamento de dados, controles e na incorporação de mais tecnologia em todo o processo. Tudo isso terá um poder significativo na continuidade do processo evolutivo do setor.
Outro elemento relevante é o aumento da atratividade do país para marcas e grupos internacionais, considerando o momento estratégico brasileiro no cenário internacional que, se de um lado trará mais marcas e conceitos internacionais, de outro lado, pelo aumento da competitividade, vai contribuir para acelerar o processo de evolução e amadurecimento.
O interesse que o sistema passou a despertar para as corporações de varejo e serviços, bem como empresas de Venture Capital e Bancos de Investimentos, como forma de expansão acelerada de negócios será outro dos fatores importantes na equação futura.
Quando grupos como Pão de Açúcar e Carrefour incluem o Franchising como estratégia de expansão mais rápida de negócios, formatos e marcas, ou quando o Banco BTG-Pactual adquire a rede Farmais, com mais de 400 farmácias, temos que reconhecer que estamos discutindo um outro nível de negócios que irá contribuir para uma nova escalada de crescimento, aperfeiçoamento e representatividade do setor.
E quando os franqueadores ousam ainda mais em direção ao mercado internacional, eles também estão dando um passo importante como exemplo para outros setores, sobre o potencial de desenvolvimento fora das fronteiras e o necessário nível de ambição que deve permear o pensar estratégico de todas as organizações, não importa o tamanho, no cenário atual e futuro. O país tem que pensar e agir global.
As próximas ondas, aquelas que virão a partir de 2010, encontrarão o setor de franquias gerando benchmarks não só dentro do sistema mas também para todo o mercado, para outros segmentos de negócios, por conta de um modelo de compartilhamento de visão, práticas, desenvolvimento e pensar estratégico, saudável e desejável em qualquer tipo de organização.
*Marcos Gouvêa é fundador e diretor-geral da GS&MD – Gouvêa de Souza